Há uma semana, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tentou colocar um ponto final em mais uma crise com o agronegócio ao editar uma Medida Provisória (MP) que abriu crédito extraordinário de R$ 4,1 bilhões para bancar subsídios do Plano Safra 2024/2025, retomando linhas de financiamento que haviam sido suspensas e assegurando contratações de crédito ao setor.
A medida foi anunciada quatro dias depois de o Tesouro Nacional ter suspendido novas contratações de financiamento subvencionadas pelo plano, em função do atraso na aprovação do Orçamento de 2025 pelo Congresso Nacional. O anúncio caiu como uma bomba no agro – setor que vem alavancando a economia brasileira nos últimos anos – e gerou forte reação negativa do segmento, levando o governo a correr para desfazer o mal-estar.
A crise envolvendo o Plano Safra é apenas mais um capítulo do cabo de guerra entre o governo Lula e o agronegócio, que apoiou amplamente a candidatura à reeleição do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), em 2022. Para o ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, que comandou a pasta entre 2003 e 2006 – no primeiro mandato de Lula no Palácio do Planalto – cabe ao Executivo a missão de emitir sinais claros ao setor e tomar a iniciativa de buscar um diálogo franco com produtores, empresários e associações do agro.
“Acho que o grande problema dessa relação é que falta conversar. Falta diálogo, falta uma busca por entendimento”, afirma Rodrigues em entrevista ao Metrópoles.
“Chamem as lideranças rurais para uma reunião, vamos encontrar uma solução! Onde está o problema? É o crédito? É a renda? É o Seguro Rural? São estradas e ferrovias? Falta uma conversa que abra espaço para o entendimento”, lamenta o ex-ministro, que é produtor rural, engenheiro agrônomo, coordena o Centro de Agronegócio na Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (EESP-FGV) e é embaixador especial da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) para o Cooperativismo.
Na conversa com a reportagem do Metrópoles, Roberto Rodrigues também demonstra preocupação com o “tarifaço” imposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre produtos importados de vários países, entre os quais o Brasil. Para o ex-ministro, uma guerra comercial envolvendo algumas das principais potências econômicas do planeta deve “mudar profundamente” a geopolítica mundial.
“Nós somos um país que tem uma dependência externa muito grande de venda de commodities, sejam agrícolas ou minerais. Se o Trump mantiver essa política provocativa de taxar vizinhos dos EUA, como Canadá e México, ou a China, pode haver uma reconstrução das barreiras tarifárias muito maior do que temos atualmente. O que seria, por si só, um problema para nós”, avalia.
Com a autoridade de quem já participou de discussões com outros países e representou o Brasil em diversos organismos multilaterais, Rodrigues defende moderação e prudência por parte do governo brasileiro ao negociar com os norte-americanos. “É uma negociação muito delicada, muito complicada, e tem de ser feita com tempo. Não é algo que se resolverá do dia para a noite. O governo brasileiro precisa ter equilíbrio e tranquilidade”, orienta.
Na entrevista, o ex-ministro da Agricultura também fala sobre o desempenho do atual titular da pasta, Carlos Fávaro; revela suas preocupações com a organização da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025, a COP 30, em Belém (PA), em novembro deste ano; e avalia o real peso político do agronegócio, com vistas às eleições presidenciais do ano que vem.